Tuesday, April 01, 2008

Ceilândia: simples e afetuosa

* Crônica publicada no jornal Aqui DF de 27 de março de 2008


Das minhas memórias mais longíquas, recordo-me bem quando, aos 3 anos, freqüentava a escolinha Jeca Tatu, devidamente distribuída entre os cômodos de uma casa na QNP 9. As brincadeiras de "estátua"e a gritaria na hora do recreio reaparecem agora como há mais de 20 anos.

Naquele cenário empoeirado e alegre, vivi desde os primeiros dias de vida até 2006. A rua, por muitos anos de terra e cascalho, tinha casas germinadas e vizinhos que viraram compadres. Entre os dias mais festivos da QNP 5, a chegada do asfalto, no início dos anos 1990, volta como um filme. No quadro-a-quadro, os moradores lavando suas calçadas enquanto a molecada desliza, faceira, sobre a pavimentação ainda quente, com seus patins, bicicletas e skates.

No início da juventude, a graça maior era atravessar a pé o campo de terra em frente à Fundação Bradesco – onde hoje está o Ceilambódromo – e andar uns bons quilômetros até a Feira de Ceilândia para visitar a melhor amiga. O lazer na cidade era parco. Sem teatro, cinema ou sala do tipo, inventávamos nosso próprio entretenimento para o ócio juvenil. E talvez pela falta de iniciativa externa, formamos tantas bandas, grupos cênicos, artistas plásticos "de quintal". E nisso, inegavelmente, a direção do então Centro de Ensino Médio 13 – agora 11 – foi fundamental: as portas da escola estavam sempre abertas para as nossas saudáveis aventuras.

Da igreja São Marcos e São Lucas ao fervilhante Centro. Das salas de aula ao quadradão, onde sentávamos para tocar violão. Dos tempos de voluntariado no hospital regional aos de alfabetizadora no Setor de Chácaras. Em Ceilândia, cresci e aprendi a ser gente. Fui moleca, estudante, adolescente. Chorei pela violência contra os meus e sorri por cada amigo e amiga que ainda levo comigo. E é por tantos momentos inesquecíveis que presto esta modesta homenagem aos 37 anos de Ceilândia, celebrados hoje. A cidade que clama por atenção. Mas que, para os que nela vivem, toca-lhes a alma com simplicidade e afeto.

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